Mosaico de Pensamentos e Textos

terça-feira, junho 28, 2005

Tens amigos

Ah, que fenômeno instigante o da amizade que se mantém, independente da convivência. Será amizade? Será saudade comum dos anos vividos em amizade?

Será saudade dos anos felizes, ou uma afinidade que se espraia no tempo?
Não sei responder. Amigos há, que levam anos sem se verem e, quando acontece, retomam a conversa como se tivessem estado juntos na véspera.

Amizades há (havia?) que se dissolvem com o passar do tempo ou a distância.

Sei que, com algumas pessoas (poucas), há uma insistência teimosa em desejar ver, trocar idéias e experiências, pela certeza da reciprocidade e do "ser aceito". Sim, talvez seja a certeza de ser aceito, uma das maiores necessidades humanas neste mundo de incompreensões. Ser aceito é a pré-condição da amizade.

Talvez o fermento da amizade seja a necessária certeza prévia de acolhimento do que somos,como somos e do que pensamos. O mistério da amizade talvez resida no alívio que traz a existência de alguém que nos acolha.

Digo acolha e, não, recolha, aí já seria dependência de um lado e paternalismo do outro.
Acolher significa receber de bom grado, previamente, sem julgamentos ou resistências. É molesto o fato de que os seres humanos vivam a julgar e que as suas opiniões prévias interponham barreiras na comunicação, sempre dificultando-a.

O mistério da afinidade consiste na inexistência das resistências ao outro, mesmo quando haja discordância. Isso não deriva apenas de afeto.

Quantas vezes há afeto entre as pessoas sem, porém, a aceitação natural, espontânea e prévia?

Verifique nas amizades tidas e vividas ao logo da vida, o que delas restou. Haverá muita vivência, boa e má. Raramente, porém, restará a amizade...

Com os anos, vão tornando-se escassas as amizades que atravessaram sem arranhões e sem mágoas o terreno íntimo que lhes é próprio, restando a amizade como fruto, após ingentes experiências humanas e existenciais, apenas (e já é tanto...).

Artur da Távola